Em 2018, o Pequeno Príncipe, que faz parte da rede de proteção à criança e ao adolescente, recebeu 586 crianças vítimas de algum tipo de violência e, em 76% desses casos, elas foram praticadas dentro da própria casa ou na rede intrafamiliar.
Neste 18 de maio, data fixada como Dia Nacional de Enfrentamento à Violência contra Crianças e Adolescentes, o maior hospital pediátrico do Brasil lembra que toda a sociedade é responsável pelos meninos e meninas vítimas de violências psicológica, física e sexual. Essa última, correspondente a 56% dos casos, é verificada potencialmente entre meninas (73%).
“Até os sete anos de idade as crianças ainda não entendem ao certo os sentidos figurados; estão exercitando essa linguagem, por isso, devemos desmistificar a ideia de que o agressor é um monstro. Por vezes, a dificuldade da denúncia pode estar atrelada a isso – como o tio querido por toda a família é um monstro? Como o padrasto tão carinhoso com a mãe é um monstro? O primo que promove os churrascos familiares pode ser um monstro?”, aponta a psicóloga do Hospital Pequeno Príncipe, Daniela Prestes, uma das responsáveis pelo atendimento a crianças e adolescentes vítimas de violências.
As marcas da infância que são levadas para a vida
Um bebê de 10 dias deu entrada no Hospital Pequeno Príncipe com traumatismo craniano. As causas poderiam ser muitas, mas ele faz parte dessa estatística: é a criança mais nova recebida em 2018 vítima de violência física. A de violência sexual tinha apenas três meses. Infelizmente, 66% dos casos de violências atendidos na instituição ocorrem antes dos seis anos de vida. Isso significa marcar a Primeira Infância com traços de crueldade que só podem ser revertidos com investimento na recuperação social e psíquica dessa vítima.
Dependendo da idade, as crianças não sabem se comunicar verbalmente e, por isso, é de extrema importância que as pessoas próximas percebam mudanças de comportamento, marcas pelo corpo ou indícios de que ela está sofrendo algum tipo de agressão. “Muita gente acha que os pais são ‘donos’ da criança. Mas isso não é verdade. É responsabilidade de toda sociedade proteger essas crianças e adolescentes”, lembra a psicóloga.
Autoagressão pode estar ligada a outras violências
Quando uma criança ou um adolescente sofre algum tipo de violência, ela pode perder a percepção da construção de valores e da maneira que lida com as dores. O Pequeno Príncipe, recebe, ano a ano, cada vez mais adolescentes que praticam a autoagressão (automutilação). Além de questões ligadas ao pertencimento a algum grupo ou depressão, por exemplo, esse escape para a dor de se automutilar ou modificar o próprio corpo pode estar ligado a uma desestrutura vivida pelos meninos e meninas.
“A violência contra a criança e o adolescente é, por vezes, crescente. Ou seja, pode começar com uma humilhação e passar ao terrorismo psicológico; ir de denegrir a imagem, à violência física. Quando essa criança chega à adolescência e passa a fazer a apropriação do próprio corpo, ela pode ter dificuldade de externar e verbalizar esses sentimentos antes subjetivos e, então, pode sim comunicar esse sofrimento de diversas maneiras. É preciso interromper esse ciclo e lembrar que negligenciar isso também é um tipo de violência”, pondera Daniela.
Campanha Pra Toda Vida
O Hospital Pequeno Príncipe, que completa 100 anos em outubro, trabalha para combater os casos de agressões diversas contra meninos e meninas, e, desde a década de 1970, mobiliza a sociedade na luta contra a violação dos direitos do público infantojuvenil. Além de fazer parte da Rede de Proteção à Criança e ao Adolescente em Situação de Risco para a Violência, realiza há 13 anos a Campanha Pra Toda Vida – A violência não pode marcar o futuro das crianças e adolescentes. A iniciativa, inclusive, foi contemplada com o Prêmio Criança 2016, concedido pela Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente a projetos inovadores voltados à Primeira Infância.
A meta é reforçar a ideia de que o cuidado e a proteção das crianças e adolescentes são de responsabilidade de toda a sociedade, e que em uma atuação conjunta é possível transformar a vida de cada um deles. Além disso, a instituição destaca a importância da denúncia, que pode ser feita à Prefeitura de Curitiba, pelo telefone 156; ao governo do Estado, pelo número 181; e ao governo federal, pelo Disque 100. Paralelamente, o Pequeno Príncipe mantém a constante capacitação e atualização dos profissionais que atuam no atendimento a crianças e adolescentes vítimas de violência.
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