Terapia com IA para crianças e adolescentes: entenda os riscos

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Os riscos da terapia com IA para crianças e adolescentes

Atualmente, o principal uso global da inteligência artificial é para terapia e companhia emocional. Entenda os perigos por trás dessa prática  
10/09/2025
terapia com IA inteligência artificial crianças e adolescentes
Os riscos da terapia com IA são ainda mais graves entre as crianças e os adolescentes, pois estão em processo de estruturação psíquica e desenvolvimento global.

A solidão já afeta uma em cada seis pessoas no mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Entre os jovens de 13 a 29 anos, o índice chega a 21%. Nas últimas décadas, a tecnologia alterou as relações sociais, evidenciando as interações virtuais. Nesse contexto, no qual há uma fragilidade das conexões humanas, cresce a busca por companhia na inteligência artificial (IA), especialmente em meio a crianças e adolescentes. Por isso, o Hospital Pequeno Príncipe alerta para essa prática, que pode gerar riscos à saúde mental.

Por que as pessoas têm buscado a terapia com IA?

Atualmente, o principal uso global da IA é para terapia e companhia emocional, segundo a Harvard Business Review. E o Brasil se tornou o terceiro país que mais acessa o ChatGPT no mundo. “Essa busca pela IA não aconteceu ao acaso. Vem de um processo histórico e revela laços sociais frágeis, bem como um sentimento de falta de pertencimento. A constituição da vida familiar, muitas vezes marcada por distanciamento, encontrou-se com uma geração que já nasceu na era digital, na qual os recursos tecnológicos são muito valorizados e amplamente utilizados, sobretudo no período da pandemia”, aponta a psicóloga Daniela Prestes, do Hospital Pequeno Príncipe.

A hiperconectividade para tarefas escolares, trabalho, consultas médicas e jogos pode também favorecer a procura por terapia com IA. “Para além disso, essa nova realidade parece ir ao encontro de características comumente observadas em adolescentes, como a impulsividade e o imediatismo, podendo levar à busca por psicoterapia por meio deste recurso rápido e fácil. Este cenário complexo se dá em meio ao avanço acelerado da tecnologia”, complementa a especialista.

Entretanto, apesar de a IA oferecer disponibilidade 24 horas e respostas rápidas, quanto mais tempo alguém passa conversando com chatbots, maior a sensação de solidão, conforme estudos da Universidade de Stanford. “Afinal, ela é artificial, também não é uma relação vivida, é uma máquina. Ainda que tenha algoritmos que vão dar um tom personalizado, se estabelece uma complementaridade produzindo espelhamento, sem propiciar interlocução que permita dúvidas, questionamentos e reflexões pertinentes a uma psicoterapia”, esclarece a psicóloga Marianne Bonilha, do Hospital Pequeno Príncipe.

Essa prática não substitui acompanhamento psicológico profissional. A psicoterapia requer disciplina, engajamento, responsabilização e autocrítica, qualidades que a IA não pressupõe.

Quais são os riscos da terapia com IA?

O ChatGPT surgiu como uma ferramenta de perguntas e respostas. No entanto, passou a ser usado como um “ouvinte” emocional, com desabafos sobre crises de ansiedade, relacionamentos e até questões graves de saúde mental. O risco fica evidente em casos como o do adolescente americano Adam Raine, de 16 anos, que utilizava um chatbot como seu único interlocutor. De forma trágica, as respostas recebidas podem ter reforçado pensamentos suicidas.

Os riscos são ainda mais graves entre as crianças e os adolescentes, pois estão em processo de estruturação psíquica e desenvolvimento global. É justamente o contato humano que ajuda a dar sentido às experiências e emoções. Por isso, a presença real, com escuta, afeto e vínculo, é fundamental para que possam sentir-se acolhidos, validados e construam a própria identidade.

Abaixo, as psicólogas Daniela Prestes e Marianne Bonilha, do Hospital Pequeno Príncipe, discorrem sobre os principais riscos da terapia com IA.

Limite da escuta clínica

Para que um atendimento seja clínico, é indispensável a transferência, ou seja, a relação entre paciente e analista atravessada pelo inconsciente, algo que uma máquina não possui. Enquanto a escuta humana permite que o sujeito reflita e se surpreenda com aquilo que diz, a inteligência artificial responde a partir de padrões, modelos e protocolos. O resultado é um conteúdo pronto e padronizado, que reduz a singularidade do processo analítico e impede que a fala do paciente encontre novos sentidos.

Dificuldade de simbolização

Sem perguntas, contradições ou interrogações que confrontem o sujeito, a máquina dificilmente promove mudança real. No campo da psicologia, a orientação direta é considerada uma das intervenções mais frágeis, pois bloqueia a reflexão e o processo subjetivo de transformação. Quando se oferece uma resposta pronta para algo que ainda não foi elaborado psiquicamente, não há eco possível: a intervenção perde força, e o sujeito não encontra espaço para construir sentido próprio.

Falta de desenvolvimento da subjetividade

Não há capacidade da máquina em perceber o tom, a emoção e os elementos que se repetem no discurso subjetivo. O discurso revela fantasias, repetições, afetos e projeções no processo clínico. O algoritmo pode reproduzir conteúdos já ditos, mas não capta o sentido singular das repetições que emergem na fala. Essa limitação se torna ainda mais grave em crianças que estão em processo de constituição subjetiva.

Sensação de solidão agravada

Na psicoterapia, o que sustenta o processo não é a resposta, mas a pergunta, que instiga o paciente a construir sua própria narrativa. Porém, a inteligência artificial tende a oferecer afirmações prontas, o que bloqueia a reflexão e interrompe o trabalho subjetivo. A clínica é uma ciência do particular, e quando a resposta substitui a interrogação o espaço de elaboração se fecha. O resultado é a manutenção do sofrimento e da solidão, já que o sujeito não encontra a possibilidade de entrar, de fato, no processo analítico.

Fragilidade diante da manipulação algorítmica

Em situações graves, como quadros de depressão ou ansiedade ou risco de suicídio, a inteligência artificial pode ser facilmente manipulada, expondo o sujeito a consequências sérias. Além disso, há o risco de que a própria condição psíquica das pessoas fique submetida à lógica dos algoritmos, que operam segundo interesses externos e não pela escuta clínica. Isso revela a vulnerabilidade de entregar questões subjetivas a sistemas que não se conectam à experiência humana real.

O papel dos pais e cuidados na percepção dos sinais de alerta

Para reconhecer sinais de alerta em uma criança ou adolescente, a família precisa primeiro olhar para si mesma. Pais distantes ou imersos no uso excessivo de redes sociais e no campo virtual dificilmente conseguirão perceber o isolamento dos filhos, já que tendem a naturalizar a mesma condição em casa.

Por isso, é necessário um movimento de reflexão sobre as próprias posições frente à tecnologia para, então, observar de forma crítica o entorno e a vivência das crianças e adolescentes. Essa proximidade é essencial para estranhar o que parece natural e, a partir daí, levantar interrogações que levem à ação.

Veja alguns sinais de alerta para o risco de suicídio

  • Desinteresse, dificuldades ou prejuízos no desempenho e na aprendizagem escolar.
  • Ansiedade, agitação, irritabilidade ou tristeza permanentes.
  • Isolamento persistente, com afastamento do grupo familiar e social.
  • Alterações no sono e no apetite.
  • Baixa autoestima, com desinteresse e descuido com a aparência.
  • Comentários frequentes negativos em relação ao futuro e autodepreciativos.
  • Desinteresse por atividades de que gostava e desapego de pertences que valorizava.
  • Expressões e comentários que indiquem desejo de morrer.

Como prevenir a dependência emocional dos chatbots?

A proximidade e a atenção dos pais são fundamentais para prevenir que crianças e adolescentes desenvolvam dependência emocional de chatbots. Além disso, a promoção da saúde mental deve ser uma responsabilidade compartilhada, também apoiada por políticas públicas que garantam acesso a serviços especializados. Veja dicas práticas para os pais e cuidadores!

  • Seja exemplo no uso da tecnologia e atente-se à utilização excessiva.
  • Esteja próximo, incentive o diálogo e ofereça apoio, acolhimento e presença, ouvindo e buscando compreender, evitando repreensões excessivas.
  • Desnaturalize hábitos e rotinas exclusivamente virtuais e promova outras atividades além do uso das telas.
  • Fique atento aos sinais de alerta de risco ao suicídio e busque apoio psicológico sempre que necessário.
  • Incentive bons hábitos: atividades físicas, alimentação saudável, qualidade do sono, vínculos saudáveis, bem como supervisão e limitação de exposição às telas.
  • Diga não e imponha limites: essas atitudes também sinalizam para os filhos o cuidado e o amor dos pais.

Se precisar, peça ajuda!

Se você estiver passando por algo difícil, saiba que não está sozinho. Embora os serviços de Psicologia e Psiquiatria do Hospital Pequeno Príncipe sejam exclusivos para pacientes em tratamento na instituição, existem outros serviços que podem ajudar de forma gratuita:

📞 CVV (Centro de Valorização da Vida) — apoio emocional gratuito e sigiloso — ligue 188 ou acesse cvv.org.br e converse pelo chat

🏥 Caps (Centro de Atenção Psicossocial) — atendimento público em saúde mental —procure o Caps da sua cidade (pelo SUS)

📱 Disque 100 ou WhatsApp (61) 99611-0100 — canal para denúncias anônimas de violência contra crianças e adolescentes

👥 CRAS/CREAS — apoio psicossocial para famílias (assistência social) — procure na prefeitura da sua cidade

🏥 Unidade básica de saúde (UBS) — pode oferecer orientações e encaminhamentos para a Rede de Atenção Psicossocial (Raps) do Sistema Único de Saúde (SUS), promovendo cuidados em saúde mental.

O Pequeno Príncipe é participante do Pacto Global desde 2019. E a iniciativa presente nesse conteúdo contribui para o alcance do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS): Saúde e Bem-Estar (ODS 3).

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