Flora Mitie Watanabe: uma das primeiras pediatras especializadas em câncer infantil no Brasil

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Flora Mitie Watanabe: uma das primeiras pediatras especializadas em câncer infantil no Brasil

“Se tivesse que contabilizar, talvez eu tenha passado mais horas dentro do Hospital do que fora. Nos momentos em que eu estava muito cansada e pensando em desistir, Deus sempre me mandou um sinal. A vida é um dom precioso e vale a pena lutar por ela todos os dias.”
26/08/2020
Flora Mitie Watanabe
A história da médica Flora Mitie Watanabe cruzou com a do Pequeno Príncipe em 1974, na residência de Pediatria

Uma médica que encara a sua jornada como uma missão. Assim é Flora Mitie Watanabe, uma das primeiras pediatras especializadas em câncer infantil no Brasil. A sua história cruzou com a do Pequeno Príncipe em 1974, na residência de Pediatria, onde havia o estágio de Hematologia com o médico Eurípides Ferreira, logo após concluir a faculdade de Medicina. Com muitos anos de dedicação à causa da saúde infantojuvenil, a médica é chefe do Serviço de Oncologia e Hematologia e inspiração para diferentes gerações. Seu trabalho é pautado pelo amor à criança, multiplicação do conhecimento e pela maneira singular de tratar os pacientes, sempre com empatia, cuidado e sensibilidade.

Outros tempos, muitos desafios

“Quando finalizei a residência, fui convidada pelo Dr. Eurípides a iniciar o atendimento no serviço de Oncologia e minha primeira reação foi dizer ‘não’. Não queria ver as crianças sofrerem sem que pudesse fazer algo, pois como ainda não havia tratamento conhecido com comprovação científica para o câncer, o cuidado era empírico e a angústia era grande. Havia todo um esforço para conseguirmos artigos americanos para embasamento no tratamento. Não havia internet, Google e era difícil acessar os artigos científicos. A Oncologia Pediátrica estava começando no Brasil. Como eu havia casado recentemente, o Dr. Eurípides conversou com meu marido – confesso que não sei o que eles conversaram – (risos) ele também me incentivou. Comecei para ajudar o instalar o serviço e estou no Hospital até hoje.”

Evolução que deixa o coração orgulhoso

“Na década de 1970, não existiam enfermarias e nem ambulatório exclusivo para a hemato-oncologia. Nós atendíamos no consultório da Emergência. Naquele tempo, a formalização não era uma realidade. Não existia fichário e nem prontuário das crianças e era tudo da cabeça, da memória do Dr. Eurípedes. Os pacientes eram internados em todos os setores e íamos fazendo a visita pelo Hospital inteiro. Quantas vezes eu fui embora e dizia ‘meu Deus eu esqueci de ver uma criança’ e voltava. Com muito esforço do Hospital, da direção e da Dona Ety, conseguimos ter a nossa primeira enfermaria exclusiva de oncologia composta por 18 leitos. Foi uma verdadeira conquista! De quatro a cinco pacientes que atendíamos por dia, hoje temos capacidade para atender em torno de 40 pacientes, levando mais esperança a mais famílias.”

Sensibilidade, segurança e verdade acima de tudo

“Por mais que o diagnóstico seja duro para as famílias e crianças, a verdade sempre precisa prevalecer. Há muitas formas de falar e nem tudo precisa ser dito numa única conversa. É preciso deixar espaço para a esperança, ouvir as preocupações, o sofrimento e as histórias de vida daquela família. A gente sofre sempre e não tem como se vacinar contra essa sensação de impotência diante da doença. Nesses momentos, peço a Deus que me dê calma para que eu possa transmitir pelo menos um pouco de segurança e esperança, pois a família precisa se agarrar a isso. Aos residentes, busco passar o conhecimento científico, mas ressalto muito também a importância de ter um olhar mais pessoal para aquela criança, de observar as dificuldades da família, ser solidário, pois precisamos continuar, acima de tudo, humanos.”

Das muitas lições que aprendeu

“Ao longo dos 45 anos trabalhando no setor, lembro da história da paciente Rutinha, que chegou para a consulta muito suja. Chamei atenção da mãe por ter levado a criança sem banho e naquele estado. Ela encheu os olhos de lágrima e me contou que, sem dinheiro para chegar a Curitiba, tinha viajado por uma semana pegando carona na estrada, havia dormido na rua, embaixo de viadutos, pedido dinheiro a estranhos para conseguir chegar. Senti muita vergonha, pedi desculpas, acionei a assistência social para ajudá-la a encontrar um lugar para descansar. Rutinha ficou curada e hoje tem filhos. E eu aprendi que não podemos julgar ninguém pelas aparências, pois nunca conseguiremos dimensionar com exatidão a dor do outro. As famílias e, sobretudo, as mães que ficam mais tempo dedicadas às crianças, são verdadeiras heroínas. Eu acho que aprendi muito mais com elas do que nos livros. Aprendi a ser mais humilde. Elas são uma lição de vida.”

“Se tivesse que contabilizar, talvez eu tenha passado mais horas dentro do Hospital do que fora. Nos momentos em que eu estava muito cansada e pensando em desistir, Deus sempre me mandou um sinal. A vida é um dom precioso e vale a pena lutar por ela todos os dias.”

Um centenário com a medicina e o carinho lado a lado

“O tempo é difícil de avaliar, pois têm momentos em que parece que passou muito rápido e outros mais devagar. Mas se tivesse que contabilizar, talvez eu tenha passado mais horas dentro do Hospital do que fora. Nos momentos em que eu estava muito cansada e pensando em desistir, Deus sempre me mandou um sinal. A vida é um dom precioso e vale a pena lutar por ela todos os dias. Por isso é um orgulho ver o Pequeno Príncipe chegar aos 100 anos. Uma parte desse tempo a gente construiu e cresceu junto. Tenho muita gratidão pelo o que Deus me deu e pelo Hospital me transformar como pessoa e como médica. Só tenho a agradecer.”

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