Mensagem do diretor corporativo

Conhecimento, intuição, planejamento, resiliência e muito trabalho marcaram o nosso ano.

Fomos bem no ano que passou, como detalharemos na sequência deste texto e no corpo deste relatório. Mas será suficiente? Para quem tem compromisso com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e percepção aguda da realidade brasileira, a resposta é não. Um sonoro não. Sabemos todos da precarização dos serviços públicos, e isso traz mais responsabilidade ao terceiro setor. Com 101 anos de história e tradição na mobilização social, precisamos mais do que nunca da união de todos os segmentos da sociedade para o enfrentamento das difíceis condições que cercam o ambiente infantojuvenil na esteira da pandemia.

O ano de 2020, logo em seu início, se apresentou como um dos mais desafiadores da nossa centenária história. Enfrentar a pandemia que se aproximava nos exigiu muita maturidade profissional e discernimento. Honramos o nosso compromisso com a infância e mantivemos o nosso hospital funcionando com todas as suas 32 especialidades. Cuidamos da saúde física e mental das nossas equipes, oferecendo acolhimento e condições seguras de trabalho. Mantivemos nossos apoiadores mobilizados, pois sabíamos que, mais do que nunca, contar com o apoio da sociedade seria fundamental para o moral de nossas equipes e, por consequência, para a sustentabilidade da nossa instituição.

“Realizamos 247 transplantes, com um importante destaque: retomamos o nosso serviço do transplante de fígado, que mesmo em ano de pandemia realizou 15 procedimentos, firmando-se como referência no Paraná.”

Do ponto de vista dos atendimentos, embora os números gerais tenham caído aproximadamente 40%, os procedimentos de alta complexidade mantiveram-se praticamente nos mesmos patamares de anos anteriores. Realizamos 247 transplantes, com um importante destaque: retomamos o nosso serviço do transplante de fígado, que mesmo em ano de pandemia realizou 15 procedimentos, firmando-se como referência no Paraná.

Nas pesquisas, continuamos avançando nos estudos relacionados às sete linhas que mantemos, e somamos a isso 17 novos trabalhos sobre a COVID-19. Nossos cientistas estão dedicados à busca de novas formas de diagnóstico e terapias que amenizem a grave e crescente crise sanitária na qual estamos mergulhados, além de darem continuidade aos estudos nas linhas de pesquisa existentes.

Na Faculdades Pequeno Príncipe, formamos a primeira turma de Medicina, e estes profissionais já estão no mercado, reforçando as equipes de saúde na linha de frente do combate ao coronavírus. Sempre tivemos muito orgulho de formar pessoas em Psicologia, Biomedicina, Farmácia e Enfermagem e de contribuir para a melhoria da saúde da comunidade. No início da pandemia, no primeiro semestre, inúmeras medidas foram tomadas para manter o padrão de qualidade do ensino, visando também evitar a evasão e a inadimplência.

Muito rapidamente foram iniciadas as aulas remotas. Os resultados obtidos em todas as frentes foram muito bons. A geração de caixa proporcionada pela atividade de ensino é determinante para o resultado do Complexo. Esses recursos estão sendo disciplinadamente reservados para o nosso projeto de expansão estrutural, o Pequeno Príncipe Norte.

“Na combinação entre as receitas e os custos, podemos afirmar que o ano de 2020 na assistência se mostrou melhor do que nossas expectativas e projeções iniciais.”

Com relação aos resultados financeiros na pesquisa e assistência, tivemos um déficit de R$ 9 milhões no Instituto de Pesquisa Pelé Pequeno Príncipe e de R$ 28,5 milhões no Hospital, totalizando R$ 37,5 milhões. A nossa receita relativa a atendimentos por convênios teve uma queda de 20%. É uma redução considerável, que só não teve impacto maior na nossa instituição em função de uma louvável iniciativa do deputado federal gaúcho Pedro Westphalen, que propôs um projeto de lei que permitiu aos hospitais que atendem o Sistema Único de Saúde (SUS) receber em 2020 pela média de atendimentos realizados no ano anterior. Essa medida, associada à queda de atendimentos provocada pela suspensão temporária de novas consultas, determinada pelas autoridades de saúde, resultou em um aumento de 14% nas receitas do SUS, pois os serviços de alta complexidade são pagos por procedimento (fee-for-service), e eles foram mantidos. No composto do ano, tivemos uma redução de receita da ordem de 6%, e nos custos diretos da assistência, 8%. Na combinação entre as receitas e os custos, podemos afirmar que o ano de 2020 na assistência se mostrou melhor do que nossas expectativas e projeções iniciais.

Por outro lado, e usando recursos captados em anos anteriores, conseguimos investir cerca de R$ 19 milhões em obras e aquisição de bens permanentes. Ainda, usamos R$ 28,6 milhões em materiais de consumo dedicados à manutenção do nosso Hospital, custeio das nossas pesquisas e treinamento e qualificações de profissionais. Esses recursos vieram do apoio de empresas, pessoas físicas e órgãos públicos, sensibilizados com a causa que defendemos.

Esses investimentos, ao longo dos anos, estão nos permitindo criar uma nova realidade de atendimento, baseada na excelência, na inovação e na compaixão, princípios que nos movem desde a nossa fundação. Temos muito orgulho de dizer que, em 2020, 74% dos nossos investidores renovaram o apoio à nossa causa.

“Nossa experiência mostra que a presença deste sentimento, o amor, é fundamental para a recuperação de qualquer paciente, notadamente o pediátrico.”

No ano que passou, algumas questões merecem destaque.

A primeira é a experiência de muitos profissionais de nosso corpo clínico e da direção dos braços operacionais, notadamente do Hospital, local mais sensível em relação aos efeitos da pandemia. Por isso a menção a maturidade profissional na abertura deste texto. A primeira reunião sobre a pandemia ocorreu por iniciativa do Serviço de Epidemiologia e Controle de Infecção Hospitalar (SECIH) ainda em janeiro. Já o primeiro encontro a respeito das possíveis consequências operacionais da crise sanitária ocorreu no início de fevereiro. Na medida em que a organização começou a refletir sobre sua preservação, as medidas preventivas foram planejadas e voltadas para a proteção de colaboradores, médicos e, principalmente, nossos pacientes e suas famílias. Em março, quando a pandemia foi decretada, já tínhamos iniciado os treinamentos de pessoal (de recepcionistas e seguranças até equipes de assistência) e dados as ordens de compra de materiais para reforço de nossos estoques em itens considerados críticos (material de assepsia, equipamentos de proteção individual e drogas de sedação, por exemplo.).

Enquanto isso, mergulhávamos na construção de protocolos que tivessem como foco o atendimento e a demanda que não iriam parar (como alta complexidade, emergências e, nelas, o Centro Cirúrgico e enfermarias específicas para a COVID-19), trazendo novas necessidades na gestão de risco por conta do vírus.

Todas as medidas foram muito acertadas e trouxeram bons resultados, enquanto novas demandas surgiram. Uma delas – e que vale menção – foi que os pacientes vítimas da COVID-19 internados em UTI precisariam ficar isolados, sem acompanhamento de uma referência emocional. Essa determinação legal foi discutida com base em nossa experiência na humanização do atendimento, com muitas décadas de tradição. Decidimos pela construção de novos protocolos, bastante rigorosos, e os implantamos com sucesso. Nossos pequenos pacientes, já acometidos por grave doença, não poderiam ficar sem o necessário conforto emocional proporcionado pela companhia de um familiar. Nossa experiência mostra que a presença deste sentimento, o amor, é fundamental para a recuperação de qualquer paciente, notadamente o pediátrico.

Uma outra ação importante foi a criação do Observatório COVID-19, para registrar de forma estruturada tudo o que aconteceu. Esse repositório de informações de todas as áreas será uma importante fonte de consulta para nosso planejamento, e também para a eventualidade de uma epidemia semelhante se apresentar no futuro.

Do ponto de vista operacional, nosso maior problema foi o afastamento de um grande número de colaboradores, que pertenciam a grupos de risco, simultaneamente ao atendimento e à testagem daqueles que apresentassem sintomas e que precisassem ficar em isolamento até que soubéssemos se estavam ou não contaminados. No início da pandemia, e por conta disso, chegamos a ter 200 colaboradores afastados. Muita gente. Força de trabalho indispensável, que exigiu reação imediata de três setores: nosso laboratório, nossa equipe de Medicina do Trabalho e a Direção de Enfermagem. No início, um dos laboratórios privados da cidade nos oferecia o resultado do teste RT-PCR em três dias úteis, enquanto o laboratório público pedia dez dias a hospitais que atendem o SUS. Decidimos pelo uso de nosso Laboratório Genômico para fazer o teste, e paulatinamente baixamos o tempo de confirmação do resultado. Hoje, conseguimos apresentar o laudo no mesmo dia. Por outro lado, evoluímos muito na correta percepção da necessidade de afastamento e também no acompanhamento no domicílio do colaborador, em caso de confirmação da doença. Sentimos a necessidade desse cuidado extra, que foi muito bem aceito pela nossa equipe e seus familiares.

“Em 2020, passamos por um teste excepcionalmente difícil, enquanto os investimentos em nossos projetos de futuro – como a telemedicina e o Pequeno Príncipe Norte – foram mantidos.”

Enquanto isso, a gestão da Enfermagem diariamente fazia remanejamentos, situação muito difícil se lembrarmos que somos referência nacional em diversas patologias complexas. Esse combinado funcionou muito bem, e continuamente fomos diminuindo o quantitativo de afastados e dominando a situação. No fim do ano de 2020, a média de afastamentos estava em 30 colaboradores.

No combinado de gestão de suprimentos, treinamento de pessoal, medicina do trabalho, laboratório, gestão de enfermagem, processos de comunicação com o público interno e externo, entre muitos outros, podemos afirmar que trouxemos ao corpo médico a segurança necessária para a aplicação dos seus conhecimentos em benefício de nossos pacientes.

Em 2020, passamos por um teste excepcionalmente difícil, enquanto os investimentos em nossos projetos de futuro – como a telemedicina e o Pequeno Príncipe Norte – foram mantidos.

Na Faculdades, o ambiente oxigenado pela curiosidade dos estudantes circunstancialmente mudou por completo. Tudo continuou, mas corredores e salas de aula ficaram vazios. Também no centenário Hospital Pequeno Príncipe tudo ficou muito diferente do que temos em nossa história e memória. Antes da pandemia, alunos voluntários e pacientes com familiares circulavam pelos espaços, trazendo cores, sons, muito movimento e alegrias. Somos uma instituição de ensino e pesquisa que estimula as crianças e os seus acompanhantes – sempre que possível – a circularem pelos espaços criados para recebê-los. Isso mudou totalmente no ano passado: os lugares ficaram vazios dessa “potência” que criamos e sustentamos por tanto tempo.

Mas vamos pensar no futuro. Iniciamos na prática o exercício da telemedicina em 2016, explorando internamente o conceito de telepresença. O desafio é fazer o conhecimento individual ou coletivo ir mais longe e chegar a quem precisa de acesso à saúde, contando com o apoio da tecnologia. A população mais vulnerável precisa ganhar atenção e beneficiar-se desses avanços, e assumimos este compromisso. Da mesma forma, não podemos deixar de dar atenção às nossas relações com o meio ambiente. Em 2021, além de tudo o que já fazemos, precisamos fazer ainda mais e melhor, sempre alinhados com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável definidos pela Organização das Nações Unidas (ONU).

Para 2021, temos um enorme desafio especificamente no Hospital, unidade operacional mais antiga e de maior visibilidade do Complexo Pequeno Príncipe. A continuidade da pandemia mostra que entraremos no segundo ano em que nossa epidemiologia será completamente diferente das séries históricas que conhecemos e incorporamos no dia a dia e no planejamento dos nossos gestores e corpo clínico. Temos uma situação nova com uma estrutura dimensionada para números assistenciais significativamente menores. E isso em ambiente econômico no qual os convênios privados tendem a ser ainda mais restritivos. O combinado traz a necessidade de revisão de nosso planejamento, o que sempre é bastante complexo. Tempos difíceis pela frente.

Em nosso interior mais profundo, desejamos que nossa cidade, nosso estado e nosso país consigam a necessária união para superar a crise sanitária, econômica, social e moral o mais rápido possível. Temos a convicção de que o nosso esforço em 2020 contribui muito para isso.

A você, que mais uma vez esteve ao nosso lado, um obrigado muito especial. Você nos ajuda a fazer a diferença em nossa comunidade e na vida de milhares de crianças e adolescentes.

José Álvaro da Silva Carneiro

Diretor corporativo do Complexo
Pequeno Príncipe