Ações de educação em saúde empoderam crianças e cuidadores para o autocuidado

Pacientes crônicos são especialmente beneficiados pelas ações, que buscam adequar as orientações a uma linguagem de fácil compreensão

Anthony tinha 8 meses quando passou muito mal pela primeira vez, após comer um iogurte e algumas bolachas de leite. Assustada, a família buscou atendimento imediato no interior do Paraná. Sem um diagnóstico e com a saúde do menino piorando, a mãe, Ana Célia Costa do Santos, procurou ajuda no Hospital Pequeno Príncipe. Novos exames foram solicitados ao longo dos meses seguintes até que veio o diagnóstico. Anthony tem uma doença metabólica rara: a deficiência da frutose-1,6-bifosfatase.

“É uma doença para a qual não existe um tratamento medicamentoso. O tratamento é a dieta correta, pois o organismo desses pacientes não consegue metabolizar a frutose”, explica a nutricionista Ana Claudia Cruz dos Santos, que acompanha os pacientes do Ambulatório de Doenças Raras. Nessas crianças, a ingestão de quantidades minúsculas de frutose ou sacarose causa níveis baixos de açúcar no sangue (hipoglicemia), com sudorese, confusão mental e, por vezes, convulsões e coma. Se o consumo for mantido, desenvolvem lesões renais e hepáticas, vômitos, deterioração mental e convulsões, podendo levar à morte.

A nutricionista informa que, atualmente, é comum os diagnósticos de doenças raras serem elucidados quando a criança ainda é bem pequena, aumentando as chances de uma vida normal. Os cuidadores são orientados sobre o que é necessário para manter a saúde da criança. Com a evolução dos cuidados, esses bebês estão crescendo, tornando-se crianças e adolescentes que têm autonomia.

Anthony é um desses pacientes. Ao passar um final de semana na casa de parentes, sem sua mãe, ele ingeriu alimentos que não são liberados na sua dieta e passou por um novo internamento na UTI do Pequeno Príncipe. “Foi a partir dessa situação que nós entendemos que não basta orientar a mãe e os demais cuidadores. Precisamos orientar a própria criança, falando numa linguagem que ela entenda”, realça a nutricionista. Foi assim que surgiu o jogo da memória que Ana utiliza nas consultas. Os alimentos são desenhados em cartões verdes, amarelos ou vermelhos, indicando para a criança quais são os de consumo liberado, moderado ou proibido.

“O jogo da memória foi bem útil para reforçar para o Anthony o que ele pode ou não comer. Ele já tem uma boa consciência, mas é criança, sente vontade e às vezes come achando que não vai fazer mal”, conta a mãe, Ana Célia. “O jogo é uma forma de ensinar e de reforçar continuamente as orientações”, ressalta a nutricionista Ana Claudia.

Doenças crônicas

Ações de educação em saúde estão presentes também em outros setores do Hospital por meio do Núcleo de Humanização, que vem implantando iniciativas que visam a desenvolver capacidades relacionadas ao autocuidado, melhorando a relação dos cuidadores com as equipes assistenciais e aumentando a possibilidade de adesão ao tratamento. O trabalho se baseia na Política Nacional de Humanização, que tem entre seus princípios a autonomia e o protagonismo dos sujeitos. 

A primeira iniciativa está sendo desenvolvida no Serviço de Terapia Renal Substitutiva (hemodiálise), sob o comando da educadora Jandicleide Evangelista Lopes. “Nosso objetivo é ressignificar a experiência nesse ambiente. Os pacientes crônicos têm uma vivência de muito sofrimento, e o sofrimento não pode perpassar cotidianamente essas vidas. Nós buscamos criar novos territórios existenciais, novos modos de ver a vida”, destaca.

Ao iniciar o trabalho no serviço, Jandicleide passou a levantar as demandas das famílias e das equipes multiprofissionais, criando um mapa com a convergência das necessidades. Esse mapa está alimentando uma agenda de encontros nos quais o conhecimento de todos é alinhado e se buscam soluções conjuntas, fortalecendo a comunicação.

Uma das principais situações que comprometiam o tratamento era o esquecimento, por parte das famílias, de levar ao Hospital os medicamentos que as crianças precisam receber após a hemodiálise. Depois de algumas conversas, a equipe entendeu que a família precisava de uma bolsa adequada para transportar esses medicamentos, bem como de uma caderneta com a descrição completa do plano terapêutico, que possa auxiliar caso a criança necessite de atendimento médico em outros serviços.

As ações de educação em saúde também estão presentes em algumas unidades de internação do Pequeno Príncipe, nas quais a equipe de enfermagem detectou a necessidade de maior compreensão, por parte dos acompanhantes dos pacientes, acerca das melhores condutas durante a permanência no Hospital. Essas condutas constam do manual “Internamento: tudo o que você precisa saber” e visam a garantir a saúde de todos, bem como estabelecer uma convivência harmoniosa, favorecendo a recuperação das crianças.

Para a nefrologista Denise Siqueira Lemos, fortalecer os laços com os familiares por meio de ações de educação em saúde é fundamental para o sucesso do tratamento, especialmente no caso de pacientes crônicos. “Dentro da hemodiálise, o convívio entre família, paciente e equipe técnica é intenso devido à frequência das sessões. Reforçar de forma positiva essa relação se torna fundamental. Exames de rotina, restrição hídrica, dieta hipossódica, anti-hipertensivos são expressões que se tornam corriqueiras e precisam não apenas ser entendidas em seu significado científico, mas também compreendidas e aplicadas de forma diária”, frisa. Para ela, o “diálogo entre equipe técnica e a família deve ser valorizado e constantemente construído, como uma via de mão dupla, com um objetivo em comum: a qualidade de vida do paciente crônico”.

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