Descobrir os mecanismos genéticos e imunológicos envolvidos na evolução da COVID-19 grave é importante para definir grupos de risco e identificar novos alvos terapêuticos, orientando o desenvolvimento de estratégias de tratamento e novos medicamentos
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma doença é considerada rara quando atinge até 65 em cada 100 mil pessoas. Existem de 6 mil a 8 mil tipos de doenças raras já conhecidas, e estima-se que 13 milhões de brasileiros e mais de 300 milhões de pessoas no mundo são acometidas por essas doenças. Ao todo, 75% dessas enfermidades afetam crianças e 80% têm origem genética. Observando as diferenças da evolução da COVID-19 nos pacientes – alguns desenvolvem quadros graves mesmo não sendo do grupo de risco –, um grupo de pesquisadores está investigando se a suscetibilidade à COVID-19 grave pode ser uma nova doença rara que afeta o sistema imunológico.
“Já sabemos que 3,5% dos pacientes que desenvolvem as formas graves da COVID-19 podem apresentar mutações em genes que afetam a sua resposta imunológica”, explica a pesquisadora do Instituto de Pesquisa Pelé Pequeno Príncipe, Carolina Prando, que integra um consórcio mundial de cientistas que investiga o tema, o COVID Human Genetic Effort.
No estudo, os pesquisadores analisaram a sequência do DNA de mais de 650 pacientes que foram hospitalizados por pneumonia com risco de morte devido à infecção pelo SARS-CoV-2 (14% deles morreram). No grupo controle foram incluídas amostras de mais de 530 pessoas com infecção assintomática ou benigna. Inicialmente, os pesquisadores procuraram por diferenças entre os dois grupos, relacionadas a 13 genes conhecidos por serem críticos para a defesa do corpo contra o vírus da gripe.
“Um número significativo de pessoas com a forma grave da COVID-19 carregava variantes raras nesses 13 genes e cerca de 3% delas não tinham um gene funcional”, destaca a pesquisadora. Esses genes governam os interferons tipo I, um grupo de 17 proteínas cruciais para a proteção do organismo humano contra as infecções virais. Quer essas proteínas tenham sido neutralizadas pelos chamados autoanticorpos ou não tenham sido produzidas em quantidades suficientes devido a um gene defeituoso, sua falta de ação é comum entre esses subgrupos de pessoas que apresentam quadro muito grave da COVID-19.
“Ao descobrir essas mutações em genes relacionados à produção de interferon tipo I, caracterizamos novos erros inatos da imunidade, que correspondem a mais de 400 do total de doenças raras conhecidas até o momento. Descobrir os mecanismos genéticos e imunológicos envolvidos na evolução da COVID-19 grave é importante para definir grupos de risco e também para identificar novos alvos terapêuticos para o desenvolvimento de estratégias e medicamentos mais efetivos para enfrentar o coronavírus”, ressalta.
Doenças raras no Pequeno Príncipe
Habilitado pelo Ministério da Saúde como serviço de referência desde 2016, há décadas o Pequeno Príncipe trabalha em favor dos pacientes diagnosticados como raros.
Com a COVID-19, o medo e as dúvidas sobre a saúde desse grupo de pacientes se intensificaram ainda mais. “O risco de contaminação de um portador de doença rara é igual ao de qualquer pessoa. Porém, a forma como a infecção vai se manifestar depende do mecanismo da doença rara apresentada”, observa a cientista.
“Enquanto não temos medidas específicas para o tratamento da COVID-19, o comprometimento das pessoas em contribuir para redução da disseminação do vírus é muito importante. Diante da suspeita de infecção pelo coronavírus, os pacientes devem conversar com seus médicos para definir qual o melhor exame para diagnóstico e, enquanto isso, já precisam iniciar as medidas de isolamento para evitar a transmissão do vírus para outras pessoas”, orienta.
No início, a maioria dos pacientes com COVID-19 apresentava comorbidades; agora, crianças saudáveis estão se contaminando mais
Referência nesse tipo de procedimento, a instituição transforma a vida de várias crianças e suas famílias